Dois heróis da Idade Média
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que o papa recorrera a fim de suprimir o evangelho, estavam fazendo
com que este mais largamente se estendesse. “Nada podemos contra
a verdade, senão pela verdade.”
2 Coríntios 13:8
.
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“O espírito de Huss, nesta fase de sua carreira, parece ter sido
cenário de doloroso conflito. Embora a igreja estivesse procurando
fulminá-lo com seus raios, não havia ele renegado a autoridade dela.
A igreja de Roma era ainda para ele a esposa de Cristo, e o papa o
representante e vigário de Deus. O que Huss estava a guerrear era o
abuso da autoridade, não o princípio em si mesmo. Isto acarretou
terrível conflito entre as convicções de seu entendimento e os ditames
de sua consciência. Se a autoridade era justa e infalível, como cria
que fosse, como poderia acontecer achar-se obrigado a desobedecer-
lhe? Obedecer, compreendia-o ele, significava pecar; mas por que
a obediência a uma igreja infalível levaria a tal situação? Era este
o problema que não podia resolver; esta a dúvida que o torturava
sempre e sempre. A solução que mais justa se lhe afigurava, era que
havia acontecido novamente, como já antes, nos dias do Salvador,
que os sacerdotes da igreja se tinham tornado pessoas ímpias e
estavam usando da autoridade lícita para fins ilícitos. Isto o levou
a adotar para sua própria orientação e para guia daqueles a quem
pregava, a máxima de que os preceitos das Escrituras, comunicados
por meio do entendimento, devem reger a consciência; em outras
palavras, de que Deus, falando na Bíblia, e não a igreja falando pelo
sacerdócio, é o único guia infalível.” — Wylie.
Quando, depois de algum tempo, serenou a excitação em Praga,
Huss voltou para a sua capela de Belém, a fim de continuar com
maior zelo e ânimo a pregação da Palavra de Deus. Seus inimigos
eram ativos e poderosos, mas a rainha e muitos dos nobres eram
seus amigos, e o povo em grande parte o apoiava. Comparando
seus ensinos puros e elevados e sua vida santa com os dogmas
degradantes pregados pelos romanistas e a avareza e devassidão que
praticavam, muitos consideravam uma honra estar a seu lado.
Até aqui Huss estivera só em seus trabalhos; agora, porém, se
uniu na obra da reforma Jerônimo que, durante sua estada na In-
glaterra, aceitara os ensinos de Wycliffe. Daí em diante os dois
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estiveram ligados durante toda a vida, e na morte não deveriam ser
separados. Gênio brilhante, eloqüência e saber — dotes que con-
quistaram o favor popular — possuía-os Jerônimo em alto grau; mas