A influência de um bom lar
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“Assim fazendo”, disse ele, escrevendo a um amigo, “os oprimi-
dos encontram duplo proveito; primeiro, aquilo que escrevi pode ser
submetido ao juízo de outrem; segundo, tem-se melhor oportunidade
de trabalhar com os temores, se é que não com a consciência, de um
déspota arrogante e palrador, que do contrário dominaria pela sua
linguagem imperiosa.” — Vida e Tempos de Lutero, de Martyn.
Na próxima entrevista, Lutero apresentou uma exposição clara,
concisa e poderosa, de suas opiniões, amplamente apoiadas por mui-
tas citações das Escrituras. Este documento, depois de o ter lido em
voz alta, entregou ao cardeal que, entretanto, o lançou desdenhosa-
mente ao lado, declarando ser ele um acervo de palavras ociosas e
citações que nada provavam. Lutero, assim estimulado, defronta en-
tão o altivo prelado em seu próprio terreno — as tradições e ensinos
da igreja — e literalmente derrota suas afirmações.
Quando o prelado viu que o raciocínio de Lutero era irrespon-
dível, perdeu todo o domínio de si mesmo e, colérico, exclamou:
“Retrate-se! ou mandá-lo-ei a Roma, para ali comparecer perante
os juízes comissionados para tomarem conhecimento de sua causa.
Excomungá-lo-ei e a todos os seus partidários, e a todos os que
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em qualquer ocasião o favorecerem, e os lançarei fora da igreja.” E
finalmente declarou, em tom altivo e irado: “Retrate-se, ou não volte
mais!” — D’Aubigné.
O reformador de pronto se retirou com os amigos, declarando
assim plenamente que nenhuma retratação se deveria esperar dele.
Isto não era o que o cardeal se propusera. Ele se havia lisonjeado de
poder pela violência forçar Lutero a submeter-se. Agora, deixado só
com os que o apoiavam, olhava para um e para outro, em completo
desgosto pelo inesperado fracasso de seus planos.
Os esforços de Lutero nesta ocasião não ficaram sem bons resul-
tados. A grande assembléia presente tivera oportunidade de compa-
rar os dois homens, e julgar por si do espírito manifestado por eles,
bem como da força e verdade de suas posições. Quão assinalado era
o contraste! O reformador, simples, humilde, firme, permanecia na
força de Deus, tendo ao seu lado a verdade; o representante do papa,
importante a seus próprios olhos, despótico, altivo e desarrazoado,
achava-se sem um único argumento das Escrituras, exclamando, no
entanto, veementemente: “Retrate-se, ou será enviado a Roma para
o castigo!”