Página 203 - O Grande Conflito

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Os nobres da França
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que os teria salvo do engano, da mancha de sua alma pelo crime de
sangue, haviam-na voluntariamente rejeitado.
Um juramento solene para extirpar a heresia foi feito na grande
catedral, onde, quase três séculos mais tarde, a “Deusa da Razão”
deveria ser entronizada por uma nação que se tinha esquecido do
Deus vivo. Novamente se formou a procissão, e os representantes da
França aprestaram-se a iniciar a obra que haviam jurado fazer. “A
pequenas distâncias haviam-se erigido cadafalsos, nos quais certos
cristãos protestantes deveriam ser queimados vivos, e arranjaram
para que as fogueiras fossem acesas no momento em que o rei se
aproximasse e a procissão fizesse alto para testemunhar a execução.”
— Wylie. As minúcias das torturas suportadas por aquelas teste-
munhas de Cristo são demasiado dilacerantes para serem descritas;
não houve, porém, vacilação por parte das vítimas. Exigindo-se-lhes
retratar-se, um respondeu: “Creio unicamente no que os profetas e
apóstolos anteriormente pregaram, e no que creu toda a multidão
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dos santos. Minha fé tem uma confiança em Deus que resistirá a
todos os poderes do inferno.” — História da Reforma no Tempo de
Calvino, D’Aubigné.
Repetidas vezes a procissão fazia alto nos lugares de tortura.
Atingindo o seu ponto de partida, no palácio real, a multidão dis-
persou-se, e o rei e os prelados retiraram-se, satisfeitos com as
realizações do dia, e exprimindo o desejo de que a obra, ora iniciada,
continuasse até à completa destruição da heresia.
O evangelho da paz que a França rejeitara havia de ser efetiva-
mente desarraigado, e terríveis seriam os resultados. No dia 21 de
janeiro de 1793, a duzentos e cinqüenta e oito anos do próprio dia em
que a França se entregara inteiramente à perseguição dos reformado-
res, passou pelas ruas de Paris outra procissão, com um intuito muito
diferente. “De novo era o rei a figura principal; novamente havia
tumultos e aclamações; repetiu-se o clamor pedindo mais vítimas;
reergueram-se negros cadafalsos; e de novo encerraram-se as cenas
do dia com horríveis execuções; Luiz XVI, lutando de mãos com
seus carcereiros e executores, era arrastado para o cepo e ali seguro
violentamente até cair o machado e sua decepada cabeça rolar no
tablado.” — Wylie. E não foi o rei a única vítima; perto do mesmo
local dois mil e oitocentos seres humanos pereceram pela guilhotina
durante os sanguinários dias do Reinado do Terror.