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O Grande Conflito
A obra de Wycliffe estava quase terminada; a bandeira da ver-
dade que durante tanto tempo empunhara, logo lhe deveria cair da
mão; mas, uma vez mais, deveria ele dar testemunho do evange-
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lho. A verdade devia ser proclamada do próprio reduto do reino do
erro. Wycliffe foi chamado a julgamento perante o tribunal papal
em Roma, o qual tantas vezes derramara o sangue dos santos. Não
ignorava o perigo que o ameaçava; contudo, teria atendido à cha-
mada se um ataque de paralisia lhe não houvesse tornado impossível
efetuar a viagem. Mas, se bem que sua voz não devesse ser ouvida
em Roma, poderia falar por carta, e isto se decidiu a fazer. De sua
reitoria o reformador escreveu ao papa uma carta que, conquanto
respeitosa nas expressões e cristã no espírito, era incisiva censura à
pompa e orgulho da sé papal.
“Em verdade me regozijo”, disse, “por manifestar e declarar a
todo homem a fé que mantenho, e especialmente ao bispo de Roma,
o qual, como suponho ser íntegro e verdadeiro, de mui boa vontade
confirmará minha dita fé, ou, se é ela errônea, corrigi-la-á.
“Em primeiro lugar, creio que o evangelho de Cristo é o corpo
todo da lei de Deus. ... Declaro e sustento que o bispo de Roma,
desde que se considera o vigário de Cristo aqui na Terra, está obri-
gado, mais do que todos os outros homens, à lei do evangelho. Pois
a grandeza entre os discípulos de Cristo não consistia na dignidade e
honras mundanas, mas em seguir rigorosamente, e de perto, a Cristo
em Sua vida e maneiras. ... Jesus, durante o tempo de Sua peregrina-
ção na Terra, foi homem paupérrimo, desdenhando e lançando de Si
todo o domínio e honra mundanos. ...
“Nenhum homem fiel deveria seguir quer ao próprio papa, quer
a qualquer dos santos, a não ser nos pontos em que seguirem ao
Senhor Jesus Cristo; pois Pedro e os filhos de Zebedeu, desejando
honras mundanas, contrárias ao seguimento dos passos de Cristo,
erraram, e portanto nestes erros não devem ser seguidos. ...
“O papa deve deixar ao poder secular todo o domínio e governo
temporal, e neste sentido exortar e persuadir eficazmente todo o
clero; pois assim fez Cristo, e especialmente por Seus apóstolos. Por
conseguinte, se errei em qualquer destes pontos, submeter-me-ei
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muito humildemente à correção, mesmo pela morte, se assim for
necessário; e se eu pudesse agir segundo minha vontade ou desejo,
certamente me apresentaria em pessoa perante o bispo de Roma;